terça-feira, 14 de outubro de 2025

Eu não sou o herói - Capítulo 01

Capítulo 01: Sentença de Morte?

Diante de Sua Majestade, o Rei, eu havia vomitado tudo o que tinha no estômago sem deixar sobras.
Agora, apoiado pelos ombros de dois soldados, eu era escoltado para fora do salão.

Não lembro de nada do caminho que percorremos até aqui.
A única sensação nítida era o toque frio e metálico da armadura roçando minha bochecha.
Aquilo, curiosamente, era até reconfortante.

Quando dei por mim, estava deitado em uma espécie de quarto de hóspedes dentro do castelo real.

Virei o rosto ainda deitado e vi, sobre a mesa ao lado da cama, um pequeno sino dourado e um copo de água.
Sentei-me, tomei um gole e deixei o líquido escorrer pela garganta até o estômago.

— Ufa...

Aquela bela mulher de uniforme de empregada havia dito antes:
“Se precisar de algo, por favor toque o sino. Irei imediatamente.”

Mesmo meio grogue, eu lembrava cada palavra da voz suave dela.
Os guardas, por outro lado, disseram algo como “Descanse bem”... mas isso já se perdeu na névoa da lembrança.

Abri o menu.

Chamava aquilo de menu, mas já não tinha certeza se esse nome ainda fazia sentido.
Havia pouquíssimas opções: apenas Status, Inventário e um simples relógio.

— Ainda não tem o botão de logout... Então é isso mesmo reencarnei dentro do jogo.

Que droga.

Logo após escolher “renascer”, aparecia uma mensagem dizendo que não seria possível retornar ao mundo original.
Ou seja, provavelmente eu nunca mais pisaria na Terra.

— Droga! Eu ainda tinha tanta coisa...

...Tanta coisa inacabada, tantos arrependimentos...?

— Espera aí... Eu fugi da realidade pra me afundar em jogos, não foi?

Sem pais, sem irmãos, sem esposa.
Nem sequer uma namorada.
Os amigos que eu tinha existiam apenas dentro do jogo nunca os conheci pessoalmente.

Pensando bem... vir parar no mundo para o qual eu sempre escapava pode até ser uma benção, não?

Comecei a listar mentalmente os prós e contras.
Não que isso fosse mudar minha situação, mas ajudava a manter a calma.

— É, quanto mais penso nisso, mais parece algo bom.

Meu nível e meus itens desapareceram, mas tanto faz.
O único problema real era o fato de eu estar dormindo dentro do equivalente local do Palácio Imperial.
Como foi que cheguei a esse ponto?

— Então quer dizer que eu vomitei na frente do Imperador ou do Primeiro-Ministro...

A náusea voltou só de pensar.
Era uma situação pesada demais para um ex-NEET aguentar.
Tentei afogar a ansiedade bebendo o resto da água de um gole só.

Para me distrair, abri o Status.


☆ Status ☆

Nome: S.R.
Idade: 18
Profissão: Não selecionada
Nível: 1
Habilidades: —


— Então os atributos como força física e ataque desapareceram, hein.

Eu lembrava bem das taxas de crescimento por nível, então estava tranquilo quanto a isso.
Mas ainda assim...

— Faz dez anos que não vejo a profissão “não selecionada”...

Naquela época, eu ainda era um novato em combate contra monstros e morria toda hora até em masmorras de rank E.
Bons tempos...

Meu nome continua sendo “S.R.” igual ao do jogo.
E agora havia um campo novo: Idade.
Parece que voltei a ter 18 anos... ótimo! Melhor notícia do dia.

Enquanto observava o painel e tentava me acalmar, alguém bateu suavemente à porta.

Meu corpo reagiu com um sobressalto.
Coloquei os pés no chão, endireitei a postura e respondi, num tom nervoso:
— Po-pode entrar!

— Com licença. Como está se sentindo, herói?

A porta se abriu com elegância.
Era a bela empregada de antes, a mesma do uniforme preto e branco igual às maid cafés do Japão.
Tinha cabelos negros cortados em bob e parecia ter uns vinte e poucos anos.

...Mas espera aí. “Herói”?

— Agradeço a preocupação, já me sinto melhor. Mas... o que quer dizer com ‘herói’?

— Ora, vossa senhoria é o Herói, claro.
Se esse título lhe desagrada, posso chamá-lo pelo nome, se preferir?

— Por favor. É S.R. E, só pra constar, eu não sou herói nenhum.

Ela levou uma das mãos à boca e soltou uma risadinha encantadora. Quase me apaixonei.

— Chamo-me Silly. E Vossa Senhoria é engraçado, S.R.-sama.

— Não é brincadeira, eu juro...

Cocei a bochecha, sem jeito.

— Se olhar seu status, verá que a profissão “Herói” está escrita lá. Essa é a prova.

Ela dizia isso com total confiança.
Melhor mostrar de uma vez.

— Quer ver por si mesma?

— Posso?

— Claro. Não vai te fazer mal nenhum.

Abri o painel, e ela se aproximou sorrindo, inclinando-se para espiar.
A distância entre nós diminuiu perigosamente.
Um perfume doce invadiu o ar e eu, instintivamente, endireitei as costas.

— Eh...?

O sorriso dela congelou.
A cor sumiu de seu rosto.

— N-não pode ser... Profissão... não selecionada...?

— Pois é, eu disse que não era... “Mil desculpas! Com licença!” — tentou dizer, mas já saía correndo, quase tropeçando.

A porta se fechou com um baque, e os passos dela ecoaram apressados pelo corredor.

Fiquei ali, sozinho.

— Então... acham que eu sou um herói?

Não, não, estão enganados.
Sou só um ex-NEET.
No máximo, no meu mundo me chamariam de “mago” sabe como é, virgem aos trinta, mas herói? Nem pensar.

— Isso... é ruim, né?

Lembrei-me de já ter lido uma light novel com um começo parecido.
O protagonista era invocado para outro mundo, mas por algum mal-entendido acabava sendo considerado inútil e expulso do país... ou fugia e virava um proscrito.

Só que aquele cara tinha um poder oculto, um presente divino absurdo.
Usava isso pra se vingar e dar a famosa “reviravolta”.

Mas eu?
Nem passei pelo “departamento de reencarnações divinas”!
Não recebi poder algum, nem bênção de deus nenhum!

— Tá, no jogo eu era forte... mas...

Abri e fechei as mãos.
O toque era real.
Se eu me ferisse aqui, doeria de verdade.
Empunhar uma espada ou lutar contra monstros seria completamente diferente.

Mesmo que o jogo fosse realista, isso aqui era outro nível de realidade.

— Bom... pensar demais não adianta. Não vão me matar de cara... espero.

Não soava muito convincente, mesmo pra mim.

...

...

...

Demorando assim...?

Já se passaram mais de trinta minutos desde que a empregada saiu correndo.
Será que estão em uma reunião de emergência?
Se for isso, o tema deve ser: o que fazer com o impostor do herói.

Olhei para a janela.

Fugir por ali seria impossível.
Parecia o terceiro andar. Se eu pulasse, no máximo escaparia vivo com as pernas viradas em purê e aí seria pego rastejando pelos corredores.

— E se eu tentar sair pela porta...?

Engoli seco.
Tentei traçar uma rota de fuga mentalmente, mas nem sequer sabia o layout do castelo.
E lutar seria suicídio: eu estava usando roupas simples de linho e um colete de couro barato.
Nível 1. Sem habilidades.

— Quer saber? Vou dormir. Dizem que a sorte sorri pra quem espera.
Vai que tudo isso é só um sonho ruim.

Com esse pensamento e uma ponta de esperança —, enfiei-me debaixo do cobertor e fechei os olhos.




Cerca de três horas depois.

— Tá de sacanagem, quem consegue dormir numa situação dessas?!

Sério, só um sociopata conseguiria.

Rolei na cama por horas, e agora a luz alaranjada do entardecer já entrava pela janela.
Soltei mais um suspiro perdi a conta de quantos.

Levantei e comecei a andar em círculos pelo quarto.
O som dos meus passos ecoava suavemente.
Tentei fazer alguns agachamentos. Resultado: só cansei.

Preciso falar com alguém.
Ainda não estou com vontade de ir ao banheiro, mas posso usar isso como desculpa pra tocar o sino.

Estendi a mão...

E então toc, toc.

Batidas na porta.

Levei um susto, mas respirei fundo e respondi com a voz firme:
— Pode entrar.

A voz do outro lado respondeu:
— Perdoe a demora, S.R.-sama. Se já estiver se sentindo melhor, Sua Majestade o aguarda.

Se fosse a primeira vez que ouvisse aquele tom cortês, talvez soasse respeitoso.
Mas agora, aquelas palavras soaram como...

Uma sentença de morte.


O Príncipe Infeliz é um Alquimista Gênio - Capítulo 02

Capítulo 02: O Filho Mais Velho do Imperador - 2

Completei quatro anos de idade e reencarnei como o príncipe chamado Arsha.

Eu ainda não tinha conhecido meu irmão mais novo.

Ou melhor, depois de um ano observando calmamente a situação, finalmente percebi uma coisa.  

Parecia que eu estava ressentido.

"Arsha, você está bem? Ah, você engordou de novo. Não ficou mais alto também?"

Um homem de cabelos pretos, com cerca de trinta anos, me levantou e me girou pela sala espaçosa, rindo.

Embora eu me lembrasse da minha vida passada, eu ainda tinha quatro anos. 

Eu não desgostava desse tipo de atenção; era divertido.

"É um prazer vê-lo, Pai. Obrigado por reservar um tempo da sua agenda lotada para me visitar."

"Tão formal! Mas suponho que Arsha já tenha idade suficiente para dizer tais coisas. Meu filho é realmente promissor."

O homem com olhos dourados estreitos, sorrindo, era meu pai e o governante do império que controlava todo o continente: o Imperador.

Meu cabelo, como filho dele, era grisalho, um pouco preto, então um pouco da influência do meu pai podia ser vista. 

Meus olhos azuis aparentemente vieram do lado da minha mãe, de acordo com Harty.

"Ahem, Majestade. Esse excesso de brincadeira pode comprometer sua dignidade."

Um dos ajudantes do meu pai o advertiu, interrompendo nossa brincadeira.  

E por um momento, ele me encarou.

Lembro-me de ter recebido esses olhares em minha vida passada. 

Mesmo que eu estivesse apenas sendo educado porque meus pais eram rigorosos comigo, eu era encarado por ser certinho e bajulador. 

Nunca pensei que vivenciaria isso no mundo adulto da corte imperial.

"Quase nunca consigo ir vê-lo, e ele deve estar se sentindo solitário. Deixe-me mimá-lo um pouco aqui. Não está incomodando ninguém."

Dizendo isso, meu pai me colocou no chão e sentou-se em uma cadeira preparada.

Esta era uma seção do palácio imperial. 

No entanto, era uma ala separada do edifício principal onde a família imperial morava. 

Era o edifício conhecido como ala esquerda do palácio, onde os numerosos príncipes costumavam viver.

Mesmo este edifício sozinho era mais luxuoso e espaçoso do que as mansões de alguns nobres, e contava com criados e cozinheiros exclusivamente para a ala esquerda. 

No entanto, a seção que me foi dada, embora espaçosa, era a mais distante do edifício principal.  

E meus encontros com meu pai nem sequer aconteciam no meu quarto designado, mas numa sala de audiências no andar de cima.  

A intenção de me isolar era cristalina.

"Tenho certeza de que você também está dando muito trabalho para o Harty. Precisa de alguma coisa?"

"Problemas? Arsha-sama também é meu sobrinho. No entanto, os sapatos dele ficaram um pouco pequenos..."

"Ah, é mesmo? Ele certamente está crescendo rápido. Gostaria de poder vir com mais frequência."

Enquanto falava, meu pai instruiu seu assistente a dar dinheiro a Harty de seus fundos pessoais.  

O assistente não fez nenhum gesto óbvio, como me encarar dessa vez, respondendo com frieza impessoal.

Este lugar era longe de onde meu pai trabalhava, e demorou para chegar aqui.  

Pelo que meus próprios assessores disseram, o plano inicial era me enviar para um palácio ainda mais distante.  

Ficava no mesmo terreno, mas longe o suficiente para exigir uma carruagem, então meu pai aparentemente ficou bravo e o impediu.  

Então, eles me empurraram para o quarto mais distante, sem deixar meu pai perceber suas intenções.

O quarto era espaçoso, mas grande demais para mim, e sua localização era requintada sutilmente separada do prédio principal.

Não pude deixar de sentir malícia.

"Arsha-sama tem se dedicado bastante aos estudos. Ultimamente, tenho lhe ensinado geografia e história."

"Ah, isso é impressionante. Quando eu tinha a idade do Arsha... nem me lembro, eu não era particularmente estudiosa."

Isso era de se esperar do terceiro filho da família de um conde.  

Sem nenhuma expectativa de herdar a casa e com a perspectiva de se casar com alguém de outra família ou ganhar um título de nobreza de uma geração por meio do serviço, ele deveria ter se concentrado em habilidades sociais ou artes marciais em vez de estudos acadêmicos.  

Eu estava apenas aprendendo porque queria saber que tipo de mundo era esse, e Harty gentilmente me atendeu.

Havia seis raças neste continente, incluindo humanos: Homens-fera, Elfos, Povos do Mar, Anões e Dragões, cada um estabelecendo suas próprias nações.  

O Império, que unia essas nações, estava localizado no interior do continente, cercado por todos os lados por cadeias de montanhas.  

Parece que antes do fundador do Império desenvolvê-la, ela era considerada uma região inexplorada.

Além disso, este mundo tinha magia e alquimia.  

Honestamente, era um mundo fascinante que nunca deixou de despertar meu interesse.  

Eu ainda era muito jovem para poder praticar, mas aprender durante a preparação foi divertido e despertou minha imaginação.

"Pai, eu quero ler livros."

"Ah, é mesmo? Havia uma biblioteca nesta ala esquerda?"

"Existe uma, mas não tem livros."

Harty respondeu secamente, para não expressar insatisfação.  

Ter uma biblioteca própria era um símbolo de status para os nobres, especialmente os de alta posição.

O quarto que usei também pertencia a um antigo príncipe, então havia uma sala cheia de estantes de livros que provavelmente era uma biblioteca.  

Entretanto, depois que o ocupante anterior morreu e o quarto foi esvaziado, ele permaneceu vazio.

"Entendo. Levaria um tempo para estocá-lo. Tudo bem, você pode pegar qualquer livro da minha biblioteca."

"Isso seria um tanto inapropriado."

O ajudante do meu pai interrompeu quando eu estava prestes a concordar prontamente.  

Não que ele tivesse alguma animosidade particular em relação ao meu pai.  

Ele simplesmente não gostava que as coisas acontecessem a meu favor.

O motivo, e isso não se limitava a esse assessor em particular, era que o ambiente da casa do meu pai era repleto de pessoas da família da Imperatriz, o Ducado de Lukaios.

Meu pai, criado na família de um conde, não tinha influência na corte imperial. Seu apoio era a família de sua esposa.  

O duque Lukaios arranjou o casamento político, esperando que seu neto se tornasse o próximo imperador.  

E atualmente, eu era o único rival do meu irmão mais novo, o desejado próximo imperador.  

Então, percebi a tendência de me suprimir durante o tempo em que me lembrei da minha vida passada.

"Então, onde é apropriado? Qual biblioteca meu filho pode usar?"

"Bem... a Biblioteca Imperial seria adequada."

O assessor respondeu desesperadamente, incapaz de negar ao filho do Imperador o acesso aos livros, mesmo que ele não quisesse que eu os tivesse.  

Meu pai pressionou, não permitindo que ele dissesse que não havia nenhuma biblioteca que eu pudesse usar.

Da perspectiva do assistente, parecia que, desde que ele conseguisse me impedir de me aproximar do meu pai, estaria tudo bem. 

Caso contrário, o plano do Duque Lukaios de me isolar seria frustrado.

Sem revelar nenhum desses pensamentos, virei-me para meu pai com um sorriso.

"Para que eu possa ler muitos livros. Obrigado, Pai."

"É mesmo? Arsha gosta de livros? Ter uma mãe inteligente torna seu filho inteligente também?"

Meu pai adorava o filho. Mas, por favor, não me interpretem mal.

"Também quero começar a praticar esgrima em breve. Estou ansioso para aprender com Helkov."

"Sim, Helkov era forte em seus dias de combate. Também aprendi uma coisa ou duas com ele quando estive brevemente no exército. Você provavelmente se machucará, mas se aprender direito, não se machucará gravemente. Obedeça bem às instruções de Helkov."


"Sim!"

Ah, esse foi um erro de cálculo bem-vindo. Achei que me impediriam, mas me encorajaram.  

Minha mãe teria gritado na minha vida passada.

Na verdade, tive a experiência de ser forçado a parar de jogar futebol. 

Eu gostava de me exercitar e tinha amigos, mas assim que me machuquei, minha mãe invadiu o time de futebol e gritou com eles.  

Eu não podia desobedecê-la e, mais do que isso, eu precisava de dinheiro e transporte, então não havia nada que uma criança pudesse fazer se seus pais se opusessem a ela.

Meu pai nesta vida era muito compreensivo e carinhoso. Eu o considerava um bom pai.

"Majestade, se não retornar logo, isso interferirá em seu próximo encontro."

"Já? Parece que é muito cedo."

"Não, por favor, olhe para o relógio ali."


O ajudante interrompeu nossa atmosfera agradável. 

Mas eu sabia.  

Aquele relógio estava rápido.  

Não consegui consertar porque não tínhamos permissão para ficar naquele quarto, e ele ficava trancado depois, me impedindo de ajustar o relógio.

Não gostei que nosso tempo entre pai e filho fosse interrompido. 

Então, decidi retaliar.

"Como Vossa Majestade Imperial, tenho certeza de que não faria nada que desse um mau exemplo. É triste, mas não há nada que se possa fazer. Hum, se possível, posso perguntar quando poderei vê-lo novamente?"

"Ah, meu filho é tão excelente que chega a ser preocupante. Estou tão feliz. Harty, vou deixá-lo aos seus cuidados."

"Sim, Arsha-sama é muito amável e inteligente."

Meu pai me abraçou e Harty sorriu ironicamente.

Somente o assistente relutantemente marcou o próximo compromisso, então perguntei secretamente ao meu pai durante esse tempo.

"Pai, posso ir ver meu irmão?"

"...A Imperatriz diz que ele não pode ser deixado sozinho ainda."

Parecia que meu pai queria que eu o conhecesse, mas a Imperatriz, do Ducado de Lukaios, estava recusando.

"Arsha, você é um bom menino. Tenho certeza de que será um bom modelo para seu irmão mais novo como irmão mais velho, certo?"

"Sim claro."

Meu pai sorriu se desculpando, mas eu decidi do fundo do meu coração ser apenas isso.

segunda-feira, 13 de outubro de 2025

Reencarnado como uma Maçã Vol. 01 - Capítulo 01

Capítulo 01: Com o Doce Aroma das Maçãs

“...Um caminhão?!”

Diante de mim, derrapando de lado, vinha um enorme caminhão desgovernado direto na minha direção.
Na carroceria, uma montanha de maçãs descartadas: as mesmas que haviam caído dos galhos durante o último tufão, pouco antes da colheita.

“Ah... acabou pra mim.”

O caminhão tombou de lado e, no instante seguinte, fui esmagado por toneladas de maçãs.
A consciência se apagou em um piscar de olhos.
Mas, de forma estranha, o doce aroma das maçãs permaneceu fino, longo, lentamente se desvanecendo.


***
**
*

Um leve perfume adocicado estimula o fundo do meu nariz.
...Espera.
Tem algo errado aqui.
Eu nem estou respirando.

“...Sr. Furu-tsu.”

Olho ao redor, mas tudo o que vejo é um espaço branco e luminoso, sem horizonte.
Onde estou...?
Abaixo de mim, o chão também é branco, macio, como algodão.
“Chão...?”
Mas... cadê meus pés?

“Sr. Furutsu.”

Ah, perdão, esqueci de me apresentar.
Sou Daisuke Furutsu, 33 anos. Solteiro. Um simples assalariado sem grandes feitos.
...Bom, pensando bem,
acho que já percebi: morri, né?

“Peço desculpas. Afastei-me por um instante e...”

Ah, sabia.
Deixa eu adivinhar você é... Uma Deusa?

“Digamos que, do seu ponto de vista, sim. Mil perdões por tudo...”

Se está pedindo desculpas sem parar, então quer dizer que eu não devia ter morrido.
Deve ter sido um erro administrativo divino, ou algo do tipo.

“Correto. Você faleceu antes da hora. Um dos meus subordinados, encarregado de administrar as ‘vidas’ do seu mundo... acabou pegando no sono. Por isso, você foi atropelado e esmagado pelo caminhão.”

Dormiu no serviço?! Isso não é um simples engano!
...Mas enfim.
Se já morri, então... vem aí o clássico, não é?
Renascimento em outro mundo! Certo?

“...Como soube disso?”

Heh. Apesar das aparências, eu leio bastante!
Principalmente histórias de reencarnação.
Tem várias formas de morrer, mas o caminhão é o clássico.
Na moral, se você é atropelado por um caminhão e não reencarna em outro mundo... isso é fraude!

“Não compreendo bem o que quer dizer, mas fico feliz que aceite tão bem. De fato, você será reencarnado em outro mundo.”

Aí sim! Chegou minha vez!
E então, qual vai ser?
Alguma habilidade especial?
Um poder absurdo?
Tipo controlar desastres naturais com um estalar de dedos?

“Estou impressionada. Você sabe bastante sobre o processo.”

Isso aí! Sem cheat, não tem graça!
Qual vai ser a minha vantagem então? Algo de força? Magia? Harem?

“Fufufu... normalmente, na reencarnação padrão, concedemos uma melhoria nas capacidades básicas, maior potencial de crescimento e, além disso, uma única ‘Carta do Destino’. Mas...”

“O quê?! Uma Carta do Destino?! Quer dizer que posso ganhar um poder único?”

“Desta vez, como a falha foi completamente minha, darei a você cinco Cartas do Destino.”

CINCO?! Isso é um festival de benefícios!
É o pacote completo: cheat, invencível e harem garantido!

“Mas há uma condição: você deverá escolher cinco cartas entre estas cem viradas para baixo. E seja qual for o destino que elas representarem, deverá aceitá-lo sem protestar. Está de acordo?”

Sem cancelamento?
Bom... vai dar tudo certo!
Fui atropelado e ainda ganhei bônus divino hoje é meu dia de sorte!

“Você é realmente otimista... chega a me assustar. Pois bem: as cartas que escolher determinarão o rumo de sua nova vida. A maioria concede bênçãos ou talentos, mas há algumas... menos favoráveis. Escolha com cuidado.”

Essa, essa, essa, essa e essa!

“Rápido demais! Está certo disso?”

Claro! Esse tipo de coisa é puro instinto! Aposto que tirei só cartas boas!

“Fufufu... vejamos então.”

As cinco cartas começaram a ser reveladas.

“A primeira é... i-incrível! Nunca vi essa antes!”

A carta mostrava um homem musculoso, exibindo o bíceps.

“É a carta da Força. Quem a recebe tem o limite de poder físico removido e um aumento contínuo de crescimento.”

UOOOOH! Começamos bem! Viva os músculos!

“A segunda... i-isso é inacreditável! Outra carta raríssima!”

Sabia! Eu tô imbatível hoje!
A carta mostrava um feixe de trigo e um cajado.

“A carta do Mago. Todas as restrições à magia são removidas. Você poderá aprender qualquer tipo de feitiço!”

ISSOOO! Magia desbloqueada! Viva os magos!



E então...

“...Espere, quem é esse? Um caminhão?!”

O veículo vinha derrapando outra vez a mesma cena, o mesmo som metálico, o mesmo monte de maçãs.
O doce aroma voltou, preenchendo tudo.




“Uau! Posso até ser mago agora! Eu sou o melhor!”

“Haha! Isso é inacreditável! E a terceira carta... aaaaah! Como pode?!”

Mais uma?!
A carta exibia um anjo olhando serenamente para o céu.

“É a carta da Bênção. Independentemente da forma que você assuma, ela concede uma restauração constante você sempre se regenerará, por mais ferido que esteja.”

Imortalidade?!
Sou o guerreiro que nunca morre! Já venci a vida!

“Não sei do que você ‘venceu’, mas... sua sorte é inacreditável! Ah, a quarta carta... AAAAAH?! Por que logo essa?!”

“Essa”? Que tipo de carta é essa?

A ilustração mostrava uma caixa de madeira simples.

“É a carta do Armazém! Permite guardar qualquer objeto inanimado infinitamente sem deterioração. Um depósito interdimensional. E mais: é única no mundo! O dono anterior deve ter morrido, e agora ela passou para você!”

Sério?! Isso é lendário!
Então posso herdar tudo que estava guardado lá?

“Exatamente. Tudo o que estiver dentro agora pertence a você.”

Se o antigo dono era um herói lendário, posso acabar ganhando uma espada mítica pra derrotar demônios!
HAHA! Isso virou o pacote premium!

“...Se é o que deseja, talvez possa mesmo alcançá-lo.”

“Beleza! Vamos à última carta!”

“...N-não pode ser!”

Hein?
A mão da deusa tremia, e lágrimas se formavam em seus olhos.

“Isso é... a carta do Último Destino. Quem a tira... reencarna no ser que lhe tirou a vida na encarnação anterior.”

“...Perdão?”



Nada vejo.
Nada ouço.
Ah... então aqui é meu novo mundo?
Como esperado, não consigo me mover.

“Sr. Furutsu? Está me ouvindo?”

Ah, Deusa! Sim, estou ouvindo.

“Que bom! Então a reencarnação... ah? EEEEEH?!”

É, não dá pra me mexer mesmo.
Nem tenho olhos, então não sei como está o entorno.
Bom, pelo menos sou feito de metal vai demorar pra enferrujar, né?

“N-não! Sr. Furutsu... você... você não é um caminhão!”

Hã?

“Sim, sim, claro que sou! Fui atropelado por um caminhão, então, pelo poder da carta, virei um caminhão. Faz sentido!”

“NÃO! Você não morreu pelo caminhão...”

...O quê?

“Você... virou uma maçã! Uma maçã vermelha e redondinha!”

“OOOOOOOOOOOO QUÊÊÊÊÊÊÊÊ?!”

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